quarta-feira, 3 de março de 2010

Titico

By Dilermartins


Titico tinha pinta de Fox Paulistinha, mas realmente era um SRD(Sem Raça Definida), um cusco, um guaipeca, um desses cães sem dono, agradava todos da casa mas ninguém em especial.
De fato tinha alma de vira-lata, não lembro quem o juntou da rua e levou para nossa casa, tenho uma vaga lembrança de que teria sido minha avó, mas certeza não. Iniciou-se entre nós, as crianças, uma corrida para saber quem seria o dono do Titico. Como tinha péssimos hábitos, adquiridos em suas andanças; virava o lixo, cavava buracos, danificava plantas do jardim, roia chinelos... Sua liberdade era diurna, à noite ficava acorrentado em sua casinha.
Toda manhã soltávamos o Titico e numa espécie de ritual, cada um o chamavam na tentativa de estabelecer propriedade, nada, o cãozinho tinha alma de gato; só dava e recebia carinhos quando bem entendia. O tempo passou e Titico nunca teve um dono. Numa manhã ele amanheceu furioso, rosnava e latia de tal forma que, com medo, desistimos de soltá-lo, aquele que não era amigo de ninguém, virou inimigo de todos... Quando o pai chegou, tentou libertar o Titico, em vão, acabou sendo mordido pelo cão enlouquecido. Os adultos chegaram à conclusão de que Titico tinha contraído Raiva, chamaram os “Homens da Carrocinha”, cujo trabalho era juntar cães vadios e sacrificá-los. Horrorizados, vimos o Titico ser levado numa jaula, rosnando e babando, direcionamos nossa frustratação para o pai; ele poderia ter esperado, medicado o cãozinho... Bem feito, um dos homens disse que o pai teria que comparecer ao Centro de Saúde para receber vinte e uma injeções, aplicadas em volta do umbigo... Deus não gosta que maltratem os animais, pensamos.
No dia seguinte a notícia: Todos teriam que receber as injeções, inclusive nós. Chegamos à conclusão de que Deus também não gosta que crianças julguem mal  seus pais.

13 comentários:

Roberta de Souza disse...

Tadinho do cachorrinho...rs

bj

chica disse...

Puxa, essa tal da carrocinha era fogo.

Lembro dela quando morava em S.Leopoldo e morria de medo que minha cachorra fugisse de casa e fosse pega por ela. Diziam que faziam sabão deles!

Quanto à injeção,era outra coisa assustadora.

Linda crônica e sobrou pra todos!rsrs abração,chica

Renata Peixoto disse...

Mas bah, guri! Coitado do cachorro!
Lembrei que, quando criança, tive uma cachorra vira-lata também. O primeiro nome dado a ela foi "pereba", mas como acharam meio repulsivo,ela passou a ser conhecida como pipoca.
Tudo ia bem até que minha mãe, que já nem pensava mais em ter filhos, engravidou da minha irmã caçula e veio com a conversa de que bebês não podiam conviver com cachorros. Conclusão, ela deu pipoca para o porteiro do prédio que um dia apenas avisou que ela tinha sumido (ou ele sumiu com ela). Pensa numa criança triste. Foi como fiquei!
Beijão

Luci disse...

bah! que titico rendeu lembranças inesquecíveis e conclusões sábias...rs!!!
bjs
ps: obrigada pelo "instigante"!!!

Anônimo disse...

Pois é, essa coisa de Carrocinha é complicado. Às vezes é pro bem do bichinho, mas dá uma pena de vê-los indo embora. Pobre Titico! E assim é o fim de muitos ~cãezinhos que não e não voltam.


Beijos!

Cinira disse...

Adorei!!!!!!!!!!!!!

Unknown disse...

Nossa! coitado do Titico!
E também dos envolvidos...Sempre esperamos um final feliz mas nem sempre isso é possível!
É a vida!
Ótimo texto!

Max Coutinho disse...

Oi Diler,

Amei este conto (da vida real?).

Eu também acho que Deus não gosta de filhos que julguem mal os pais...aliás, julgar mal quem quer que seja não pode agradar a ninguém (revela falta de bom senso).

Muito bom!

Um abraço

Francisco Sobreira disse...

Que beleza, Dilermano, ouvir Vivaldi. E bom também ler o texto sobre o Titico. Há episódios da infancia que ficam para sempre gravados na memória do adulto. Um abraço.

Marco Antônio disse...

Agora não sei de quem tive mais pena, do cão ou dos que tomaram as tais injeções. Grande abraço

Dalva Nascimento disse...

Ah,Diler! Que história mais triste! Certamente o cãozinho não tinha sido vacinado, não é? Imagino como vocês, crianças, se sentiram. Afinal, Titico já devia estar conquistando um pouquinho do coração da garotada...

Bjs.

César Elias disse...

Adorei a crônica! Nada como aprender com as inusitadas lições do dia-a-dia... e como marcaram na memória, hein?

grande abraço,
desculpe a ausencia nos posts... ta movimento essa vidinha aqui!

Dalva Nascimento disse...

Sinto tanta pena do cachorrinho... e das crianças também! Deve ter sido difícil para todos.

Bjs.